O Sinal e Selo da Fé

Pai Abraão—Parte 4

Romanos 4.9–12

Introdução

Em Romanos 4, Paulo está ilustrando que a justificação não é conquistada e não é merecida como resultado de uma vida perfeita de santidade. Ele já ilustrou esse fato ao usar dois homens proeminentes na história de Israel—o grande patriarca Abraão e o maior de todos os monarcas, Davi.

Nem Abraão, nem Davi puderam afirmar que foram perfeitos. E já desenterramos várias ilustrações das páginas do Antigo Testamento para provar isso. A partir de um estudo mais detalhado da vida desses homens, fica óbvio que ambos foram pecadores.

Abraão mentiu em duas ocasiões, colocando Sara em grande risco. Ele também desobedeceu a ordem de Deus de abandonar sua família, pois ele levou consigo seu pai e sobrinho idólatras. Ambos esses homens causaram atraso e divisão. Abraão fracassou em confiar em Deus durante o período de fome também ao descer para o Egito e confiar no faraó pagão.

Davi, como descobrimos, foi culpado de adultério, assassinato, mentira e hipocrisia.

Paulo está simplesmente tentando provar por essas ilustrações que esses dois homens não mereciam ir para o céu.

Abraão: Justificado pela Fé Somente, Não pela Circuncisão

Agora, Paulo prevê uma reação por parte de seus ouvintes judeus. Ele diriam naturalmente: “Certo, Paulo, você nos mostrou que esses dois homens pecaram, mas não se esqueça que eles eram circuncidados; eles tinham a marca física da aliança; então, eles eram salvos.”

Em Romanos 4.9-10, Paulo escreve:

Vem, pois, esta bem-aventurança exclusivamente sobre os circuncisos ou também sobre os incircuncisos? Visto que dizemos: a fé foi imputada a Abraão para justiça. Como, pois, lhe foi atribuída? Estando ele já circuncidado ou ainda incircunciso? Não no regime da circuncisão, e sim quando incircunciso.

O tempo da circuncisão e da justificação de Abraão

Nesses versos, Paulo simplesmente relembra os judeus um pouco da cronologia de Abraão.

Abraão: circuncidado na idade de 99 anos

• Abraão foi circuncidado quando seu filho, Ismael, tinha treze anos e Abraão tinha noventa e nove anos. Isso é visto em Gênesis 17.

Abraão: justificado na idade de 85 anos

• Abra sua Bíblia em Gênesis 15.6, onde nos é dito:

Ele creu no SENHOR, e isso lhe foi imputado para justiça.

Em outras palavras, Abraão colocou sua fé no Deus vivo e verdadeiro e Deus o justificou! Isso aconteceu quando Abraão tinha oitenta e cinco anos de idade.

Portanto, Abraão foi justificado por Deus quatorze anos antes de ser circuncidado.

Posso até imaginar os líderes e rabinos judeus na correria para encontrar um rolo da Torah. Eles encontram Gênesis, releem a passagem e dizem: “Eita!” Ou seja: “Paulo está certo de novo e nós estamos errados.”

Note Romanos 4.11:

E recebeu o sinal da circuncisão como selo da justiça da fé que teve quando ainda incircunciso; para vir a ser o pai de todos os que crêem, embora não circuncidados, a fim de que lhes fosse imputada a justiça,

Em outras palavras, a circuncisão não justificou Abraão diante de Deus; a circuncisão foi apenas um sinal e selo de que Abraão já era, na realidade, considerado justo diante de Deus.

A circuncisão judaica: qual a sua utilidade?

O problema era que, na época de Paulo, a nação judaica tinha se esquecido do propósito do sinal da circuncisão e tinham se apaixonado por ela. Os rabinos ensinavam: “A circuncisão salva do inferno.”

Na Midrash, um comentário judaico, está registrado: “Deus jurou a Abraão que nenhum circuncidado seria enviado ao inferno.”

Na verdade, isso ainda foi posteriormente desenvolvido em outro comentário judaico para evitar que um judeu “caísse pelas brechas” e findasse no inferno. A adição a esse comentário dizia: “Abraão se senta ao portão do inferno e não deixa nenhum israelita circuncidado entrar lá.”

Então, Abraão, o coitado, é confinado a se sentar diante do portão do inferno para se certificar de que nenhum de seus descendentes entre lá por acidente. Imagine que tipo de existência essa crença confina Abraão a ter. Ele, o grande patriarca, o pai da fé, que deveria estar desfrutando do paraíso, está confinado a se sentar à entrada do inferno para não deixar nenhum judeu entrar lá.

E o que dizer do judeu que era perverso e pecador, ele também não deveria ir para o inferno? Os rabinos resolveram esse probleminha com o ensino que, se um judeu foi tão ruim que ele deveria ser condenado por Deus, havia um anjo cujo trabalho era desfazer a circuncisão desses homens antes de os enviar ao inferno.

A propósito, havia tanta confusão e ansiedade sobre a questão da circuncisão que ela quase dividiu a igreja de Jerusalém. No livro de Atos, capítulo 15, vemos um debate acirrado para decidir se os crentes gentios tinham que ser circuncidados. Um concílio se reuniu e a decisão foi a de permitir os gentios se tornarem membros da igreja sem a marca como os judeus.

Então, qual era a utilidade da circuncisão? Por que Deus deu esse ritual a Abraão e seus descendentes? Esse foi um sinal a ser abandonado posteriormente com o estabelecimento da igreja do Novo Testamento.

Paulo responde a essa pergunta. Veja novamente a primeira parte do verso 11: E recebeu o sinal da circuncisão como selo da justiça da fé.

A circuncisão era um sinal e um selo.

A circuncisão era um sinal

A circuncisão era um sinal. Ela era um sinal de que:

• os judeus eram uma raça distinta de pessoas;
• os judeus tinham uma aliança com Deus; e
• os judeus eram separados de todas as demais nações para Deus.

Para o que um sinal aponta

Agora, um sinal aponta para algo muito mais importante que o próprio sinal!

Se você já viajou de carro pelo país, você já viu placas de sinalização sinalizando para alguma coisa. Depois de viajar vários dias, você vê placas para a sua querida cidade: “Curitiba—100 km.” Quando você vê essa sinalização, você não para seu carro no acostamento, sai dele, abraça o sinal e diz: “Finalmente, cheguei em casa!”

Não. Esse é apenas um sinal que aponta para a verdade maravilhosa de que sua casa está mais perto!

O problema com símbolos e cerimônias religiosos ainda existem em nossos dias, bem como existiu nas gerações de um passado recente. Elas se esquecem para o que o sinal aponta e se apaixonam pelo sinal.

Deixe-me explicar isso com uma ilustração. Eu uso a minha aliança como um sinal de que sou casado. Onde quer que eu vou, quer seja um local aqui no Brasil ou em outro país, as pessoas podem olhar para a minha mão, ver a minha aliança e ter a certeza de que eu sou casado. Agora, se você tirar sua aliança, isso não significaria, de forma alguma, que, de repente, eu deixo de ser casado.

Agora, continue seguindo meu raciocínio. Eu não sou casado por causa que uso essa aliança; eu uso essa aliança porque sou casado! Na verdade, eu poderia ser solteiro e usar uma aliança simplesmente porque não desejo ser incomodado por ninguém. Eu não me torno casado por estar usando aquela aliança; eu apenas uso essa aliança como sinal de que já ou casado!

Da mesma maneira, com ou sem a circuncisão, uma pessoa pode ser um crente verdadeiro de Deus por meio de Cristo.

Em Romanos 4.9-12, a questão para Paulo não era: “Será que a circuncisão foi importante para Abraão?” A questão é: “Será que a circuncisão salvava Abraão?”

A resposta, conforme Paulo, é: “Não!”

A circuncisão como selo

Paulo também diz que a circuncisão era um selo.

Nos tempos bíblicos, um selo poderia ser cera derretida em um documento com um brasão impresso. Isso representava uma declaração de autoridade.

Recentemente, eu fui com minha filha mais nova fazer o passaporte dela. Ela irá comigo para a Ilha de Malta, onde eu estarei pregando para alguns missionários que trabalham no Leste Europeu. O passaporte chegou em nossa casa outro dia. Quando abrimos, vimos o símbolo de nosso país estampado. O selo comunica a mensagem de que ela é uma cidadã deste país e que toda a autoridade deste país a apoia em sua viagem ao exterior.

Qual é o selo do crente do Novo Testamento? Assim como Abraão recebeu um selo físico comunicando o fato de que ele era um cidadão da nação de Israel, nós também recebemos o selo de nossa fé que comunica que somos cidadãos dos céus. E não é uma marca física, a propósito, mas uma pessoa que habita dentro de nós—o Espírito Santo de Deus.

Paulo escreveu em 2 Coríntios 1.21-22:

Mas aquele que nos confirma convosco em Cristo e nos ungiu é Deus, que também nos selou e nos deu o penhor do Espírito em nosso coração.

Ele também escreveu em Efésios 1.13-14:

em quem também vós, depois que ouvistes a palavra da verdade, o evangelho da vossa salvação, tendo nele também crido, fostes selados com o Santo Espírito da promessa; o qual é o penhor da nossa herança, até ao resgate da sua propriedade, em louvor da sua glória.

Tanto a antiga como a nova aliança possuem um selo, mas com certas diferenças, tais como:

Aqui está o ensino fundamental nesse parágrafo de Paulo em Romanos 4.9-12: “Abraão não é o pai daqueles que foram simplesmente circuncidados; ele é o pai daqueles que realizam o mesmo ato de fé em Deus!”

Meu amigo, a verdade chocante é a de que o gentio não vem a Deus ao se tornar um judeu na prática; o judeu é que vem a Deus ao se tornar um gentio na prática! Isso é visto no fato de que Abraão ainda era um gentio quando Deus o justificou e Deus o justificou quatorze anos antes de ele receber a marca da distinção do povo de Israel.

Abraão: “pai dos que têm fé”

Então, a pergunta permanece: “Como Abraão é ‘pai dos que têm fé’?”

Nós chamamos William Carey de o “Pai das Missões Modernas” porque ele foi um dos primeiros a deixar o Reino Unido e ir para o campo da Índia.

Nós chamamos Martinho Lutero de o “Pai da Reforma” porque ele foi a figura central daquilo que se tornaria a Igreja Protestante. Ele arriscou sua vida para seguir as Escrituras.

Da mesma maneira, Abraão é chamado de o “Pai da Fé” porque:

• ele foi o primeiro daqueles que se tornariam uma nação de seguidores; ele “abriu o caminho” da fé;
• ele arriscou sua vida em obediência à Palavra de Deus.

Paulo usa uma frase maravilhosa para ilustrar essa verdade no verso 12:

…daqueles que…também andam nas pisadas da fé que teve Abraão, nosso pai, antes de ser circuncidado.

Como Podemos Imitar Abraão

Como que Abraão “abriu o caminho” da fé para todos nós, quer crentes do Antigo ou do Novo Testamento? Deixe-me fornecer algumas maneiras a você.

• Abraão creu na Palavra de Deus sem jamais ter experimentado a plenitude das promessas.

Mesmo que Abraão tenha visto o milagre do nascimento de seu filho quando ele e Sara já tinham passado várias décadas dos anos de conceber, as promessas a Abraão ainda se concretizariam no futuro.

Pense, por um momento, na promessa de possuir a terra. O mais incrível é que Abraão nunca possuiu a terra de Canaã, a não ser por um campo pequeno onde ficava a Caverna de Macpela, a caverna onde ele depositou o corpo de sua querida esposa Sara.

Imagine só, Abraão viu a Terra Prometida e morou na Terra Prometida e peregrinou pela Terra Prometida como nômade, mas nunca a possuiu. Na verdade, seus descendentes só possuíram a terra mais de quinhentos anos depois de a promessa ter sido feita!

Contudo, Abraão viveu a promessa. A verdade é que a promessa na qual Abraão creu não foi a da posse da terra por seus descendentes. O que Abraão estava realmente buscando? Hebreus 11.10 nos conta:

porque aguardava a cidade que tem fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e edificador.

Ele estava em busca do reino de Deus na terra.

Abraão creu na Palavra de Deus sem jamais ter experimentado a plenitude das promessas.

• Abraão creu em Jesus Cristo sem jamais tê-lO visto pessoalmente.

Abraão creu em Jesus Cristo mesmo sem saber muito a respeito dEle ou sabendo muito menos do que nós do Novo Testamento sabemos. Nós sabemos os detalhes acerca do nascimento, morte, sepultamento e ressurreição. Não sabemos quanto Deus disse a Abraão concernente a Cristo, mas sabemos que Deus preanunciou o evangelho a Abraão.

Ouça as palavras de Paulo em Gálatas 3.8-9:

Ora, tendo a Escritura previsto que Deus justificaria pela fé os gentios, preanunciou o evangelho a Abraão: Em ti, serão abençoados todos os povos. De modo que os da fé são abençoados com o crente Abraão.

Você consegue imaginar isso? Deus foi o pregador e evangelizador do evangelho de Jesus Cristo a Abraão séculos antes.

Talvez você se lembre do discípulo Tomé. Em João 20.28, Jesus entra em cena e Tomé exclama: Senhor meu e Deus meu! Jesus reponde no verso 29: Por que viste creste? Deixe-me dizer uma coisa para você, Tomé: Bem-aventurados os que não viram e creram.

Em outras palavras, “Bem-aventurados os que, assim como o Pai Abraão, creram que eu vim de Deus mesmo jamais tendo visto o Meu rosto.”

Conclusão

Então, Abraão se torna o “Pai de todos os que andam nas pisadas da fé.” Ele, o precursor da fé, se tornaria o pai da fé de:

• Calebe, que buscou possuir as montanhas pela fé no poder de Deus;
• Maria e José, os quais andaram pela fé até Belém, maravilhados e admirados com o que Deus estava fazendo em suas vidas;
• Raabe, que queria desesperadamente deixar aquele passado sórdido de prostituição e se agarrar ao povo de Deus;
• Rute, a moabita que se apegou a Noemi e deixou seu povo e seu lar;
• Os magos da Pérsia que vieram adorar o recém-nascido Rei;
• O eunuco etíope que creu;
• Cornélio, o soldado romano que desafiou a ira de César e seguiu a Cristo;
• Lucas, o médico gentio que escreveu sua própria narrativa do evangelho, bem como o livro de Atos;
• e Tércio, o gentio que, com sua própria mão, escreveu o livro de Romanos enquanto Paulo ditava para ele.

Contudo, isso é apenas o começo. Abraão se tornou o pai de todos aqueles que creem no Filho de Deus sem nunca O terem visto; que creem sem jamais terem experimentado o reino de Deus na terra—nós somos filhos e filhas de Abraão.

E isso não é por causa de alguma marca física, mas por causa da vida espiritual concedida pelo Espírito de Deus nos corações daqueles que colocam sua fé no Filho de Deus.

Este manuscrito pertence a Stephen Davey, pregado no dia 22/09/2002

© Copyright 2002 Stephen Davey

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